O Malfadado Remake de Psicose.




*O Texto A Seguir Está Repleto de Spoilers*

Adaptação do livro homônimo de Robert Bloch, lançado no Brasil pela Darkside Books, em 1960 o mestre do suspense Alfred Hitchcock (que embora fosse um gênio, era abusivo nos sets de seus filmes como você pode ver aqui) lançou a obra prima do cinema Psicose.
Acompanhamos Marion Crane (numa interpretação brilhante da incrível Janet Leigh, certamente a mais famosa de sua carreira), que rouba um alto valor em dinheiro de seu patrão e durante sua fuga se hospeda no Bates Motel, um motel praticamente falido na beira de uma estrada abandonada que é cuidado por Norman Bates (na melhor interpretação da carreira de Anthony Perkins). Em um dos maiores e mais surpreendentes plot twists da história do cinema, Marion é assassinada brutalmente na metade do filme é a trama então centra-se em Lila Crane (interpretada por Vera Miles) e Sam Loomis (interpretado por John Gavin), a irmã e o amante de Marion, respectivamente, que passam a procurá-la depois de seu desaparecimento.
Psicose é um filme que dispensa apresentação, creio que todo mundo conhece e mesmo que não tenha visto o filme inteiro, ao menos conhece a clássica cena do chuveiro.


Vanguardista, foi um dos primeiros filmes a conseguir driblar a censura da época e mostrar desde um vaso sanitário em um filme (o que não era permitido na época) à sugestões de nudez e contar com recursos somo um falso protagonista na trama, o filme é uma aula de como se fazer cinema. As atuações são incríveis, a direção é impecável, a edição é ótima, a direção de arte é fenomenal, enfim Psicose é uma obra inquestionável. Eis que 38 anos após o clássico, a Universal fez um anúncio, no mínimo, corajoso: Iriam lançar um remake de uma das maiores obras da história.
Dirigido por Gus Van Sant, e com um elenco de rostos famosos da época, o remake foi lançado em dezembro de 1998 e foi um escândalo: O filme é uma refilmagem no sentido mais literal da palavra. Psicose havia sido regravado quadro a quadro, copiando toda a obra original, porém a cores e com um elenco novo.
A história é exatamente a mesma, a montagem de cenas, posição dos atores nos enquadramentos, posição de câmeras e a edição são, em 95% do filme uma cópia "idêntica" ao original.


Van Sant sempre foi grande fã do trabalho de Hitchcock e de psicose, em especial. Após ele ter conseguido certo reconhecimento depois de dirigir Garotos de Programa, a Universal contatou Van Sant e pediu se ele tinha interesse em dirigir algum remake de alguma obra do catálogo do estúdio, no que ele disse que tinha interesse em fazer um remake de Psicose. Ele não conseguiu, como dito pelo próprio diretor, riram na cara dele quando ele disse qual obra queria.
Alguns anos depois quando dirigiu o filme Gênio Indomável e este foi indicado a 9 óscares, incluindo melhor direção, dos quais levou dois (melhor roteiro original e melhor ator coadjuvante para o saudoso Robin Williams), a Universal entrou em contato novamente e ele apresentou o mesmo projeto, refilmar psicose quadro a quadro, em cores e com novo elenco, e dessa vez, aceitaram.
Van Sant comprou uma cópia do filme e usando o roteiro da obra original, Van Sant escalou Anne Heche com Marion, Vince Vaughn como Norman, Julianne Moore como Lila e Viggo Mortensen como Sam e deu início ao seu, como chamado por ele mesmo até hoje, experimento cinematográfico.


Qual é a necessidade de fazer um remake? O argumento mais usado para isso é que o remake tem a função de apresentar uma obra para um público novo e também para os estúdios poderem lucrar em cima do saudosismo da obra que já foi sucesso, porém existem filmes cuja técnica é tão atemporal que simplesmente não existe motivo para que se faça um remake, e psicose definitivamente é uma dessas obras! Então, por que Van Sant fez esse filme?
Além dele ser muito fã da obra e querer prestar uma homenagem ao seu ídolo, ele sempre tratou a obra como uma experiência cinematográfica, e embora odiado por critica e público, esse filme é necessário. É o único filme da história feito nesses moldes (regravando o filme original quadro a quadro e usando o mesmo roteiro) e pela recepção que a obra teve, muito provavelmente ele sempre será o único. 


Embora refeito o filme quadro a quadro e sendo Hitchcock quem é, não é necessário dizer que o filme não chega aos pés do original. Diferente do que acontece com outros remakes que podem ser vistos sem serem comparados com o filme original, nesse caso é impossível que a comparação não exista e Van Sant foi corajoso demais em querer fazer uma obra que inevitavelmente seria comparada para sempre com um dos maiores clássicos do cinema de um dos diretores mais importantes da história.
 Eu gosto muito do trabalho do Van Sant, Elefante é um dos meus filmes favoritos, porém aqui é complicado demais ver os traços do diretor. Ele estava tão focado em copiar a obra de Hitchcock que esqueceu de fazer o seu próprio filme, sua direção de elenco é tão ruim que o filme ficou sem identidade. Embora o filme use o mesmo roteiro do original, o diretor deu liberdade aos atores para comporem seus personagens da maneira que quisessem, e isso foi um erro. Anne Heche tem uma atuação horrível, sua Marion é desprezível, sempre com cara de nojo e um ar de soberba, porém Vince Vaughn leva todo o destaque com uma das atuações mais medíocres da história! Ele está o tempo fazendo tanta força para entregar uma atuação ao nível do que foi a de Perkins, porém entrega uma atuação pífia que é extremamente exagerada ou apática durante os 103 minutos do longa e é simplesmente impossível gostar do que nos está sendo apresentado em tela, o que é uma pena, pois ambos são ótimos atores. 
A única coisa que não critico nesse filme é a participação de Julianne Moore, pois ela é um cristal sem defeitos que vou amar e defender a vida toda.

  
Muito pouco se vê da direção de Van Sant ali. Ele estava preocupado demais em não subverter a obra de Hitchcock (como deixa claro na cena em que um Hitchcock digitalmente inserido no filme aparece "dando uma bronca" no diretor no canto), que ele pouquíssimo faz, quase nada além de algumas cenas em que os atores estão em posições opostas a como apareciam no original.


Há algumas sutis alterações na trilha sonora também. Ele também utiliza a trilha sonora do original com alguns acordes levemente acelerados, mas a alteração vem em algumas cenas em que a clássica música do filme é utilizada antes dos assassinatos como um sinal de mal presságio, indicando que alguma merda vai acontecer. Van Sant aumenta também a temática sexual que no filme original apenas era sugerida, como a nudez que há no remake na cena do chuveiro que no original é mostrada com menos "detalhes" e no momento em que Norman espia Marion pelo buraco na parede ele se masturba, o que não acontece no original em que ele apenas observa Marion, creio que por Van Sant entender que aquela era a intenção de Hitchcock que não pode ser feita na época. No momentos chaves de mortes também são inseridas algumas imagens aleatórias na tela, como uma mulher vendada, nuvens e um bode no meio da rua, creio que para indicar a confusão mental dos personagens naquele momento. 


Embora seja um filme ruim, precisamos reconhecer que ele é um filme importante para o cinema. É um exemplar de como remakes não devem ser feitos e mostrou os estúdio e ao diretor que pode copiar um obra do começo ao fim, quadro a quadro e isso não irá gerar uma obra que vá atingir o mesmo êxito que o original.  Mas é importante reconhecer que ele conseguiu manter-se no imaginário dos cinéfilos e fomenta discussões até hoje e é isso que me fascina tanto nessa obra.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

História Real? Contatos de Quarto Grau.

Skins, Primeira Geração.

A Catastrófica Produção de "A Ilha do Dr. Moreau".